(ou reflexões pós-carnaval)
Está lá, ou pelo menos estava há séculos antes de Cristo, nas paredes do Templo de Apolo, em Delphos, na Grécia, a frase: "Nada em Excesso". Talvez esse seja um dos registros mais antigos dos efeitos de uma ressaca no homem. Imagino aquele grego, acordando no dia seguinte da esbornia, cheio do mal estar e, através da filosofia – super novidade da época –, chegou a esta magnífica conclusão de que o excesso não tá com nada. Resolveu gravar a conclusão na parede do templo de Delphos pra alertar os convivas, já que aquele era um dos lugares mais movimentados da região.
Ao lado desta salutar máxima está uma outra, que ficou mais famosa ainda, pois foi citada por Sócrates, Krishna, Jesus Cristo, outros avatares cósmicos e, também, por filósofos mais recentes : "Conhece-te a ti mesmo". Na realidade a frase completa é "Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo". Mesmo resumido, o enunciado se mantém forte através dos tempos e há muitos motivos para desconfiar que o "conhece-te a ti mesmo", apesar de ser a mais famosa das frases de Delphos, se originou de desdobramentos filosóficos do "nada em excesso", ou seja, da ressaca.
Logo após descobrir que excessos não são bons pra vida, nosso amigo grego deve ter pensado: "mas como vou saber se é excesso ou não? A medida do excesso para um gigante seria o mesmo para um homem normal? O excesso para um homem seria o mesmo para uma mulher?". Sabendo o óbvio de que cada um é cada um, chegou facilmente na conclusão de que só vai perceber o excesso quem se conhecer bem. Pronto! O Templo de Apolo ganhou mais uma anotação nas suas paredes.
Pelo jeito que levamos a vida parece que não, mas todo mundo sabe que a ressaca é causada por desequilíbrio fisiológico do corpo, ou seja, ingestão de toxinas, desidratação e outros desdobramentos físicos. E expandindo o mesmo conceito para além do físico, temos a "ressaca moral".
A ressaca física é de fácil diagnóstico e cura, há remédios e métodos que são tiro e queda na diminuição dos sintomas até que o próprio corpo se cure. Entretanto, contra a ressaca moral, ainda não inventaram nada muito eficiente. Mesmo com os ansiolíticos e antidepressivos, não existe cura efetiva, mas só o alívio dos sintomas, pois a causa da dor pode durar anos e, muitas vezes a vida toda se não houver uma mudança profunda no modo de vida do enfermo. Por isso muitos passam o toda a vida sedados das mais diversas formas, pois ao parar com o sedativo, a causa da dor moral continua lá e volta a doer. É mais difícil curar o espírito.
Perdemos o fio da meada. É evidente que não nos conhecemos bem e que o excesso é uma das únicas formas de felicidade que, erroneamente, supomos dispor. Guerreamos a vida toda para conquistar o excesso de conforto, de dinheiro, de comida, de experiências; mas só conseguimos a ausência de saúde, de dinheiro, de tempo, ausência de nós mesmos na nossa vida. Acho que é hora de voltarmos a pensar no assunto e voltarmos a saber quem realmente somos e tomar controle sobre nossos desejos e nossas atitudes, mirando um futuro realmente feliz, sem amanheceres insalubre, dolorosos e desidratados, física e espiritualmente.
2 comentários:
"excesso é uma das únicas formas de felicidade que, erroneamente, supomos dispor."
Bem verdade! Excelente reflexão, Tiago!! Pra variar, mandou muito bem.
Fico sempre feliz por causar, faísca que seja, no coração das pessoas. É vivendo, aprendendo e colocando em prática. Obrigado, Leca.
Postar um comentário