Apesar de "O Arquipélago" ser, também, o nome da última parte da saga "O Tempo e o Vento", do Érico Veríssimo, que eu adoraria fosse o tema de hoje, ainda não tomei fôlego para lê-la, portanto, falaremos do arquipélago tradicional, o conjunto de ilhas, mesmo.
Desde que me entendo por gente ouço, soando pelas bocas do mundo todo, a frase "nenhum homem é uma ilha", máxima que nos lembra sobre nossa existência ser coletiva, conectada e interdependente, uns com os outros. Nos últimos anos, com a constante observação e, porque não, exploração de mim mesmo, me deparei com uma espécie ecossistema fisiopsicológico singular, complexo, quase autossuficiente – veja bem: quase – que existe dentro das minhas fronteiras. Então me veio a pergunta: será que não somos, mesmo, uma ilha?
Por curiosidade histórica, pesquisei sobre a tal frase que me provocou estas reflexões e descobri que ela foi cunhada por John Donne, um poeta inglês, e publicada, em 1624, na obra "Devoções para Ocasiões Emergentes”, composta por vários tomos – coincidentemente, também assim é o "Tempo e o Vento", do Veríssimo. Um desses tomos é o "Meditações XVII", no qual se lê a famosa: "Nenhum homem é uma ilha, sozinho em si mesmo; cada homem é parte do continente, parte do todo". Como bônus da pesquisa, também entendi o título do livro "Por quem os sinos dobram" do Ernest Hemingway, publicado em 1940. Inspirado por Donne, Hemingway usa o final da meditação sobre o homem-continente como ideia central, título e palavras de abertura do livro. Aí vai: "...a morte de qualquer homem me diminui, porque eu sou parte da humanidade; e por isso, nunca procure saber por quem os sinos dobram, eles dobram por ti”.
Agora, voltando à questão da nossa solitude e conexões, é impossível negar natureza coletiva da nossa existência. Vivemos, sem sombra de dúvidas, em uma conexão inevitável uns com os outros, no mundo inteiro, com o universo todo, inclusive. E como alertou John Donne, devemos considerar toda interação como necessária, como mecanismo de evolução e crescimento individual e, por consequência, coletivo. Por isso escrevi o "quase" autossuficientes lá no segundo parágrafo.
Mas, ao mesmo tempo, não podemos negar a nossa natureza de ilhas, como seres completos em nós mesmos. Mesmo que, às vezes, meio desequilibrado, o nosso ecossistema pessoal é completo em si mesmo, complexo e feito para se sustentar, perfeitamente, quando sozinho. Exatamente como o ecossistema de uma ilha, cada um de nós tem as suas peculiaridades e a capacidade de permanecer em harmonia consigo mesmo, sem necessidades de grandes influências externas.
Lembro, ainda, como me lembraram numa palestra que, apesar da aparência isolada, todas as ilhas estão fisicamente conectadas umas às outras pelas profundezas do mar. Elas também interagem e se influenciam pelas correntes marítima e, até mesmo, pelas correntes invisíveis de ar. Ou seja, não importa o quão fundo ou quão invisível esteja a conexão, ela existe e é real. John Donne estava parcialmente correto. Somos ilhas, sim! Completos em nós mesmos. Mas, independente se grandes e firmes porções de terra, ou minúsculos bancos de areia ou rocha, estamos inevitavelmente conectados, nos complementamos, formando um grande e belo arquipélago.
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