Morador ilustre do local de 1968 a 1970: Jim Morrison.
Entretanto, além da saudade, temos outro efeito colateral, que é a total falta de controle que se tem de interagir com a extremidade oposta do plano em questão. Aplicando essa teoria nos fatos que me aconteceram a pouco, fica mais fácil de compreender.
Estou longe, longe de tudo o que me era (e ainda é) querido. E se um desses bens distantes deixasse de existir, sem meu ultimo olhar, palavra ou manifestação? E foi o que, tristemente, me aconteceu: Tia Lourdes faleceu nesse dia 21, fulminante, rapidamente, não sofreu. Não nos despedimos e não vamos nos falar mais em momento algum dessa vida.
Lourdes agora é memória, assim como tudo o que deixa de existir. Isso pode nos levar a divagações sobre "o que realmente é existir" ou sobre os conceitos de "realidade" e "irrealidade" ou até mesmo sobre "imortalidade". Mas não é ali onde quero chegar.
Poderia falar sobre a pessoa de minha tia e a falta que uma pessoa pode fazer no mundo (o que é bem óbvio). Gostaria apenas enfatizar o quanto a decisão de ficar distante tem um peso absurdo na vida de todos. Nesse caso o "distanciar-se" pode ser entendido num sentido maior do que o apenas físico. A pessoa que se encerra em si e não se comunica, a pessoa que se comunica pela metade, a pessoa que esquece de se expressar, estão tão distantes do mundo e dos entes queridos quanto pessoas em lados opostos do globo.
Assim como eu, todos pagam o preço da distância, mas o valor a ser pago só se sabe depois que se decide. Se vale a pena ou não, depende de como se honra a escolha. Entretanto sei que a falibilidade e delicadeza da vida nos permite aceitar esse preço, pois no fim das contas, todos fomos feitos para partir. Orbitamos em torno de algo que se chama vida e a todo momento nos aproximamos e nos distanciamos, num bailar constante e inevitável, conforme nossos "sins" e "nãos". Somos como os planetas e estrelas ao redor do sol.
Enfim, partir requer coragem para dar o primeiro passo, perseverança para continuar a andar e estômago para regressar e enfrentar o que ficou. Quem compra a briga?
Que isso ilumine quem precisa de luz e entretenha quem precisa de entretenimento.
Eternamente lobservando.
Abraços.
Poema de Natal
por Vinicius de Moraes
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos –
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será a nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos –
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez, de amor
Uma prece por quem se vai –
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte –
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Poema em Memória de Maria de Lourdes Fonseca
"Professora, mãe, avó e minha tia, falecida em 21 de maio de 2007.
Quase noite aqui no norte
E por telefone recebo a notícia:
"Nesta tarde veio a morte
e nos levou a tia benquista"
Restou-me apenas recordar
e dedicar-lhe uma oração.
E por sempre incentivá-los
deixo um poema, de coração.
Lembro-me do andar vagaroso e cauto,
das conversas sobre o mundo,
de como o ser humano pode voar alto
ou provar do poço o fundo.
Lembro da infância, tão contente,
várias visitas pelo ano.
Também dos anões no jardim da frente,
e na sala o tapete fofo e o piano.
Exercia o sagrado ofício:
lecionava Geografia.
Professora no colégio
e mestre por todo o dia.
E naquela noite fria,
deixou seu exemplo como legado.
Foi uma honra tê-la na família
Espero que também tenha gostado.
Hollywood, 24 de maio de 2007.
Link para meus outros poemas.