Hoje é 28 de Dezembro e nos restam apenas mais 4 dos 365 dias que nós mesmos nos damos para chegar a algum lugar. Apesar de todo mundo saber que a divisão do tempo é algo arbitrário, o dia em que a terra termina uma volta completa em torno do sol é tomado em consideração para varias coisas sérias e outras nem tanto.
O dia 31 de Dezembro é o dia da ressaca moral, igual àquela manhã com dores de cabeça e estomago embrulhado, quando você decide nunca mais beber como na noite anterior e resolver lavar a roupa suja com ex-afetos e alguns desafetos. É nesse dia "ressacal" de fim de ano que decidimos não cometer mais os mesmos erros do ano que passou.
E assim, como as segundas-feiras são o dia preferido para se começar dietas depois de um domingão farto em gulodices, o primeiro dia do novo ano é o preferido para se começar grandes planos, depois de um ano farto de eventos mirabolantes, de índole duvidosa, bons e maus. Mas da mesma forma que a decisão de segurar a onda na festança nunca vigora, quando nos damos conta, já estamos nós no decorrer do ano, fazendo novamente tudo o que planejamos não fazer.
Não seguir as regras é algo muito natural do ser humano, então, nada melhor do que rir disso tudo, e o Luis Fernando Veríssimo pode ajudar muito nessa hora. Em seu livro Orgias (1989, ed. L± relançado em 2005 pela Objetiva), ele celebra essas horas mágicas das festas, quando as pessoas se divertem pelo simples prazer da diversão e acabam entrando em algumas saias justas e situações cotidianas especialíssimas. Enfim, se é dito que a vida é uma festa, então nada mais normal do que estabelecer regras e não segui-las todas.
Festejemos o Ano Novo e adjacências!
Várias pessoas se identificarão com os personagens do diálogo abaixo, uma reflexão animada de fim de ano, um pedacinho de uma das crônicas que estão no livro, que vale a pena ser lido por inteiro, como qualquer obra dos Veríssimos. Enfim, tenham um final de ano bastante inspirado e um 2009 acima da média. Divirtam-se!
- O que é isso?
- Aquele livro que você me emprestou.
- Eu não me lembro de…
- Faz muito tempo. E, na verdade, você não emprestou. Eu peguei. Eu costumava fazer isso. Nunca mais vou fazer.
- Você pode ficar com o livro. Eu…
- Não! Ajude a me regenerar. Quem fazia essas coisas não era eu. Era outra pessoa. Um crápula. Decidi mudar. Este sou o eu 2006. Comecei devolvendo todos os livros que peguei dos amigos. Acabou com a minha biblioteca, mas que diabo. Me sinto bem fazendo isto. Outra coisa. Precisamos nos ver mais. Eu abandonei os amigos. Abandonei os amigos! Olhe, vou à sua casa este sábado.
- Não. Ahn…
- Prometo não roubar nada.
- Não é isso. É que…
- Já sei. Vamos combinar um jantarzinho lá em casa. A Santa e eu estamos ótimos. Fiz um juramento, na noite de ano bom. Que me regeneraria. E ela me aceitou de volta. Há dois dias que não olho para outra mulher. Dois dias inteiros! Isso era coisa do outro.
- Sim.
- Do crápula.
- Sei…
- Eu era horrível, não era? Diz a verdade. Pode dizer. Uma das coisas que eu resolvi é não bater mais em ninguém. Era ou não era?
- O que é isso?
- Como é que eu podia ser tão horrível, meu Deus?
- Calma. Você está transtornado. Vamos tomar um chopinho.
- Não! Não posso. Jurei que não botaria mais uma gota de álcool na boca.
- Mas um chopinho…
- Está bem. Um. Em honra da nossa amizade recuperada. E escuta…
- O quê?
- Deixa eu ficar com o livro mais uns dias. Ainda não tive tempo de…
- Claro. Toma.
- E vamos ao chope. Lá no alemão, onde tem mais mulher.
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