terça-feira, 11 de novembro de 2014

Livro : O Sacy Pererê [1918, Monteiro Lobato]



Saci-Pererê e Monteiro Lobato - o resultado de um encontro

A preocupação com a preservação da cultura e folclore nacionais não é nova. Em 1917, o grande Monteiro Lobato, criador do Sítio do Pica-Pau Amarelo, publicou uma pesquisa no Estadinho (apelido carinhoso da edição vespertina d’O Estado de São Paulo) e pediu para seus leitores lhe enviarem relatos de experiências com o Saci-Pererê. Para tanto era só enviar uma carta com o seguinte questionário respondido: Como o leitor havia descoberto o mito? Como é a crença nele nos dias atuais? E quais experiências passadas pessoalmente ou ouvidas o leitor poderia contar?

O resultado desta enquête foi o livro Saci-Pererê - O resultado de um inquérito, publicado no ano seguinte (1918), com quase 300 páginas cheias de histórias do endiabrado 'muleque perereca'. Alguns o descrevem como um demoniozinho feioso, alguns como um moleque sacana e perneta. Com gorro, com ou sem rabo, não importa, o que vale mesmo são as deliciosas histórias do tinhosinho sendo trazidas do esquecimento para a realidade. Este foi o primeiro livro de Monteiro Lobato, teve a tiragem inicial de dois mil exemplares, bancados pelo próprio autor, que assina o livro sob o pseudônimo de Um Demonólogo Amador. Para ajudar nas despesas o escritor colocou anúncios especialmente desenhados com o tema Saci-Pererê pelo cartunista João Paulo Lemmo Lemmi, também chamado de Voltolino.



Capa da edição original de 1918, a mesma da edição fac-similar de 1998. 
Em ambas o grande atrativo é a 'graphia' no português da época.


Primeira Guerra Mundial estava em seu ápice em 1918, e Lobato usa essa obra para questionar o conceito de civilização nos moldes franceses que as elites brasileiras insistiam em reproduzir. Ele demonstrava a necessidade de se aprofundar os estudos sobre as lendas, crendices e costumes brasileiros, para que pudéssemos conhecer mais sobre nossa cultura.

De conteúdo simples de se ler, com um tema apaixonante e uma linguagem que varia conforme o grau de instrução de quem escreve cada história, o livro é um prato cheio para quem procura bons momentos de conhecimento e prazer. Inclusive existem lindíssimas passagens escritas com a linguagem do matuto iletrado do interior, que são nada menos do que tesouros da nossa língua. Ainda mais se, assim como eu, você também ouvia essas histórias quando pequeno.

Inclusive esta obra, lançada antes do famoso Urupês, não constava na bibliografia oficial de Monteiro Lobato, que ironizou o fato de sua estréia literária ocorrer por meio de uma obra não-assinada, pois ele só organizou material de terceiros. Até que em 1998, a Fundação Banco do Brasil e a Odebrecht publicaram uma edição fac-similar, ou seja, idêntica à original, embelezada com a grafia do português da época, torna tudo muito mais saboroso. Foi uma edição de cinco mil exemplares para serem distribuídas à bibliotecas e está, infelizmente, fora do comércio há anos. Mas não fique triste, pois a Editora Globo, no início de 2008, publicou uma edição revisada e atualizada desta jóia do folclore nacional. Já com o português atualizado, tirando aquele charme extra e surpresas da leitura, mas o conteúdo está todo lá, sempre interessante. De qualquer forma, independente de qual versão você conseguir, não perca a chance e agarre o seu.



Capa da edicão de 2008, pela Editora Globo.





Ps: Leia aqui um fragmento do livro.


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