Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
O poema acima, Versos Íntimos, é de Augusto dos Anjos (1884-1914), e foi publicado em seu único livro “Eu”, em 1912. Comprova o que não é novidade pra ninguém: vivemos, e não é de hoje, em tempos obscuros. A vaidade, a hipocrisia, o egoísmo, o orgulho, o materialismo, e outros tantos tipos de conduta humana são como nuvens densas, cortinas espessas que bloqueiam a luz do sol da verdade e da vida e espantam o calor do amor que se propaga em suas ondas.
Se analisarmos os noticiários, poderíamos concluir que regredimos intelectual e moralmente, e isso nos afeta o pensamento e as atitudes cotidianas. Nas palavras do poeta : “O Homem, que, nesta terra miserável, mora entre feras, sente inevitável necessidade de também ser fera”. E muitos assim o são a contragosto, lutando contra intuições e consciência, fazendo o mal ao outro e um ainda maior a si mesmo, pelo medo de serem marginalizados, no afã de serem aceitos.
É claro que existem os que agem mal por conta própria, mas assim o fazem por ignorar o bem que podem fazer ou, ainda, por ignorar as implicações funestas que tais atos trazem para si. Se soubessem, se fossem despertados, convidados e convencidos a fazerem o bem, não por discursos hipócritas, mas por atitudes reais no cotidianos, fariam o bem sem dúvidas.
Há, na Bíblia, uma passagem na qual Jesus diz: “Ninguém, depois de acender uma candeia, a cobre com um vaso ou a põe debaixo duma cama; pelo contrário coloca-a sobre um velador, a fim de que os que entram, vejam a luz”. E é de focos de luz o que precisamos nesta hora escura pela qual passamos.
Voltando aos noticiários, agora com mais atenção e focados no bem, é perceptível nossa evolução. A maioria das manchetes pedem pelo fim de más atitudes, antes consideradas normais. Nos tempos de Augusto dos Anjos, famílias se reuniam para assistir à enforcamentos em praça pública; jogavam gatos vivos, dentro de sacos, em fogueiras, para deleite e riso; os duelos de morte entre cavalheiros eram grandes eventos sociais; antes ainda, era costume assistir animais selvagens despedaçarem e devorarem seres humanos.
É bom ver que Hoje já não somos mais assim, apesar de ainda existirem alguns resquícios disso. O sangue e a dor alheia ainda atraem atenção, conforme diz o historiador Leandro Karnal, pelo alívio de constatar que a vítima da vez não fui eu. É instinto. Mas, como ele também diz: “isso passa”. E está passando, é questão de tempo e trabalho, como demonstra a história.
Se a hora é escura, façamos luz. Acendamos e ascendamo-la! Sem esconde-la debaixo da cama da preguiça, da mesa da vaidade ou detrás das cortinas do medo. É preciso que quem tenha a luz ilumine o máximo possível.
PS: Se gostou desse texto, sugiro a leitora deste aqui.
Um comentário:
Eu não escrevo tão bem como você, mas arrisco Ó:
Esse T é
Todo Talento
Tanta Ternura
Tudo Tiago.
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